terça-feira, 13 de setembro de 2011

As Religiões Existem por Causa da Morte 2.



Quando somos crianças, tudo o que sabemos sobre a vida é que, um dia, iremos crescer. E mesmo isso parece não nos incomodar muito. Na adolescência, a vida é um parque de diversões, e não nos preocupamos nem um pouco com a morte, talvez pela falta de hábito de nos preocuparmos seja com o que for. Quando muito, nós vemos a morte como uma "doença de velho", e a velhice, como um país distante onde nunca precisaremos pôr os pés. Só quando nos tornamos adultos é que as apresentações são feitas, e a morte passa a fazer definitivamente parte das nossas vidas, por assim dizer. E é aí, também, que a eternidade, até ali apenas conhecida de ouvir dizer nos catecismos, nos sermões e nas orações que sempre repetíamos sem sequer prestarmos atenção ao que estávamos dizendo, é só aí que a eternidade vem nos seduzir, e se consumar como a solução perfeita para um problema tão estupidamente inevitável, tão absurdamente sem sentido, tão completamente inconcebível quanto a ideia do nosso próprio fim.
              Quanto mais o tempo passa e nos damos conta da inexorável marcha que estamos fazendo em direção ao túmulo, mais a perspectiva da eternidade nos parece plausível, e mais a fé religiosa se fortalece, porque só mesmo um deus para nos conceder a graça de continuar a existir após o nosso funeral.
              O culto a Deus é, na verdade, o culto à morte. Praticamente toda a doutrina cristã se fundamenta em coisas a serem vividas numa outra dimensão, cujo portal mágico que nos levará a ela é a nossa própria sepultura.
              Jesus Cristo, supostamente o Deus em pessoa, havia orientado os seus seguidores a desprezar este mundo (um mundo que, também supostamente, ele mesmo havia criado) em detrimento de um outro ainda por vir, a ser desfrutado no além-túmulo. Os seus poucos ensinamentos que podem ser considerados aproveitáveis — copiados e adulterados de doutrinas mais antigas do que ele — foram apenas uma maneira de estabelecer a norma de conduta necessária para se obter um passaporte para uma outra vida — não essa —, num outro mundo — não esse.
              A fé religiosa se baseia e se sustenta na sua capacidade de manter viva essa ilusão coletiva da imortalidade; essa certeza autoimposta de que a morte não é o fim. Tudo o mais foi inventado em volta disso, para dar suporte a esse sonho, e vazão a essa vontade desesperada de que não sejamos mesmo tão insignificantes quanto parecemos ser: um amontoado de átomos que adquiriu consciência de si mesmo e, desde então, passou a se julgar a coisa mais importante do universo.
              Foi por ter negligenciado o tema da imortalidade que o Deus cristão nunca fez sucesso com os seres humanos. Não importava o quanto ele chantageasse os pobres-diabos do Antigo Testamento; nem quantos povos exterminasse para mostrar como era forte; nem quantas mágicas fizesse, nem quantas vezes aparecesse em público, as pessoas não davam muita bola pra ele. Mesmo tendo sido o autor de toda a Criação, mesmo sendo o ser mais poderoso do universo, foi só quando conseguiu mostrar que tinha poderes para driblar a morte — se sujeitando a uma autoimolação em público —, e propagandear que seus seguidores também seriam agraciados com essa recompensa, caso se dispusessem a puxar o seu Saco-Santo por toda a vida, só depois disso que Deus passou, de fato, a receber alguma admiração sincera.
              Um Deus que sabe construir mundos, que atende a preces e que nos protege de perigos não nos seria tão útil quanto um Deus que nos permitisse viver nossas vidas na ilusão de que seremos eternos.

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